quarta-feira, 21 de agosto de 2013

por hoje

há que beber muita água
esperar o fim para arrumar o quarto

há que lavar as toalhas,
as paredes

recolher os objetos que ele deixou pela casa.

A sétima margem do Rio

como é que faz o luto
de uma coisa boa, mas incompleta?
como é que faz o luto de uma coisa que não foi nem veio
como é que faz o luto de um homem vivo
que nunca veio
mas que promete repete e é um homem tão bom
como é que faz o luto desse caos desesperançoso
todo cheio de amor

como é que faz o luto de um pedaço pouco trágico de falta
de uma aresta mal aparada, da fenda, da farpa
como é que faz o luto de um corpo sem órgãos e ossos
de um troço cheio de carne e bolhas de ar
de um momento preenchido de espera
desespera, espera, desespera, desperta aperta, espera, desespera, despe
como é que faz?

Como é que faz o luto de um estrangeiro
de uma mala de couro
de um personagem?
Como é que faz o luto de uma não passagem, de uma eira nem beira
da miragem
do fim sem partida,
da margem.

estou atrasada.

Eu, essa pessoa mimada querendo superar os vivos.

Como é que faz pra parar de reclamar de boca cheia e barriga vazia?
como é que supera a fome de ontem?
como é que faz hoje a comida?
Como é que se espera lutar por menos, não pedir pagamento atrasado
juros
como é que se quer um velho que não envelhece?
como é que reza mesmo a porra daquela prece?
eu tenho demais, não tem nada dentro de mim
porque é que eu não sei fazer o que todos fazem?
porque é que eu, com pai vivo, saudável, sorridente,
preciso desesperadamente aprender um luto esquivo, oblíquo,
seca sem estiagem
esse rio caudaloso sem margem,
enchente dura empoeirada
corredeira de vento
meu pulmão sedento
água salgada agreste
cana de açúcar nunca mata a minha sede.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

cinco minutos

se eu temer você me mostra
o lado certo
da moeda?
se eu tremer você me aponta aposta a porta
o lado de fora da folha, a margem direita da estrela do norte?
corte, pique, estique distinga o que gritou antes de mim
rasgue, cole, reflita  o que ficou atrás

será o chão pordebaixo pôr debaixo, põe deibaixo
dos teus pés um calço, uma mula, um avião um tranco
põe um tranco
o passo, o vaso quebrado, o braço
travesseiro.

descalço tem mais sentido
denada tem menos brio
que o seu queixo olhando da janela aquela estrada feia fera floresta

será possível?
infesta.

se eu tremesse você puxava a toalha, o pano pra manga, o tapete
se eu firmasse você degolava um peixe
e seria seria assim um desesperaço sem eira nem feira nem fim, plumas e gotas de
invista desista desperta

fora isso
festa.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Leio livros por dinheiro

Leio livros por dinheiro.
Gostaria de oferecer os meus serviços. Senhores, sou leitora, é este meu ofício.
Quero, alias, ganhar dinheiro com isso. Não muito, até porque sou contra tudo o que é muito prolixo.
Aceito pagamento em cerveja, quando for pra ler coisa boa, sem vícios.
-Mas é preciso botar algo no mundo! dizem. Pois o mundo tem coisas demais, demais!
Alguém precisa ler os livros que se bota no mundo!
Quero ler. E quero comer também. Portanto, aguardo ofertas.
Pesquisar, ensinar, escrever e entender, são outra conversa.
Se for pra entender, escrever e ensinar a pesquisa, lerei bem e plenamente
em médias três livros na vida.
Alguém precisa ler os outros!
O serviço é relevante, de qualidade e sem charlatanismo.
Trabalho honesto, devotado, insisto!
Produzir tamagoshi, cortar cabelo, desenhar cadeiras, imprimir dinheiro.
Eu? eu leio.
E quem quiser que conte outra.

(Afora isso, talvez gostasse de ser carteiro)